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ANO MARX E A CRÍTICA TEATRAL

Atualizado: 2 de jan. de 2018

Texto: Luiza Moraes


foto: Marcelo Valle (10 Dias que Abalaram o Mundo)

“O teatro! Aí está o argumento da crítica. Teatro é isto, teatro é aquilo. Ah, meu Deus! Não vou parar de repetir: eu vejo muitos teatros, não vejo o teatro. Não existe o absoluto, nunca! Em nenhuma arte! [...] Toda vez que alguém quiser encerrar-vos num código declarando: Isto é teatro, isto não é teatro, é preciso responder decididamente: O teatro não existe, o que existe são teatros, e eu busco o meu.”

(ZOLA, Emile)


Qual a relação entre teatro e sociedade?

O teatro não independe da sociedade e também não é reflexo da mesma. O teatro em si mesmo não apenas reproduz como também produz relações sociais.

Partindo do pressuposto que todo teatro é político, entendendo aqui político em seu sentido primordial – aquilo que diz respeito ao interesse público -, sabemos que o teatro está, bem como todas as outras atividades culturais, sociais e econômicas, inserido na luta de classes.


Se fazer teatro é não só estar no palco, mas também pensar teatro, escrever teatro, criar para o teatro e criticar teatro, do mesmo modo que historicizamos as peças teatrais ao estudá-las dentro da academia, precisamos cada vez mais historicizar também a crítica teatral.


Em seu livro “As aventuras de Karl Marx contra o Barão de Munchhaüsen”, Michel Lowy contrapõe o materialismo ao positivismo. Pensemos a respeito desses diferentes modos de organizar o pensamento.


Permissão para desvio do foco.


Ao cair em um pântano com seu cavalo um homem se puxa pelos cabelos e salva a si próprio e ao animal.


A história não te soou convincente? Muito simplificadamente essa é uma das anedotas do Barão de Muchhaüsen que nos permite pensar alegoricamente a visão positivista do mundo. Como se fosse possível alguém se colocar acima da história ou de fora da luta de classes. É o velho mito da imparcialidade. Mais uma ideologia burguesa que nos é constantemente enfiada goela abaixo.


Retornemos ao pensamento que iniciou o devaneio.


Como tudo o que é histórico e, portanto, transformável, a crítica de teatro não é uma entidade que não possa e não deva ser questionada. Em primeiro lugar, precisamos compreender que o exercício de crítica nunca é imparcial. Algumas vezes o ponto de vista está explicitado e outras vezes está oculto. Mas ele jamais pode estar ausente.

A Companhia Ensaio Aberto segue o exemplo da teórica Iná Camargo Costa e explicita sempre seu mirante: o marxista. Assumimos o partido que tomamos na luta de classes. E, como todos aqueles que se posicionam, enfrentamos os prós e contras.

Quem escolhe o caminho de luta sabe porque escolheu lutar. Conhecemos aliados e inimigos. Estudamos as armas de cada um.


Em seu livro, “O teatro e sua realidade”, Bernard Dort já escrevera sobre o problema da crítica teatral. Historicizou a crítica. Desnaturalizou o que era imposto como algo habitual. Olhou com estranhamento para o que parecia cotidiano. Percebeu na crítica de teatro uma atividade pertencente a determinada parcela da sociedade: a classe dominante. Essa crítica seguia – ou segue – a determinado modo de organização de pensamento e a um ponto de vista específico imbuído de interesses de classes.

O teatro precisa dos espectadores uma atitude cada vez menos passiva não só dentro da sala de espetáculos.


“Não achem natural o que acontece e torna a acontecer [...] para que imutável não se considere nada.” (BRECHT, Bertolt, 1930.)


Esperamos de nossos quartos criadores uma postura não de submissão às declarações de críticos, mas sempre de dúvida. Não no sentido de invalidar as observações de outrem, mas no sentido de considera-las sempre parciais e não totalizadoras. É imprescindível avaliar que se trata de um mirante em meio a muitos outros. E, levando isso em conta, optar por um lado.


Interrompemos então este pensamento para dar voz a Émile Zola:


“Os críticos afirmam, com uma aparência de razão: as peças são feitas para os espectadores, devemos louvar as que os espectadores aplaudem. O público, por sua vez, pede desculpas por gostar de peças tolas, afirmando: meu jornal diz que esta peça é boa, vou vê-la e aplaudi-la. E assim a perversão se torna universal.”

(ZOLA aput. DORT, Bernard)


A partir disso, a Companhia Ensaio Aberto almeja que os espectadores-críticos deixem de pensar nos escritos da crítica como mera opinião e deseja, sobretudo, que os companheiros de categoria não mais individualizem ou pessoalizem críticos que emitem comentários destrutivos acerca de seus trabalhos. A questão está para além do âmbito privado com o crítico A ou B em relação a determinados espetáculos. Estamos pensando, portanto, a respeito da história do teatro e da conjuntura teatral a cada momento.


Retornamos assim, ao ponto de partida de Zola e, como Brecht, afirmamos e reafirmamos que se a crítica não nos considera como fazedores de teatro, então que seja. Somos operários do taetro.


Se saímos do circuito mercadológico nos nossos temas, na nossa estética e na do nosso modo de produção, consequentemente e conscientemente saímos também do circuito da crítica.

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